quinta-feira, 1 de março de 2018

SOFIELIZE

No meio de uma escuridão profunda, havia uma menina. Ali parada, olhando fixamente para frente, uma expressão catatônica, e os olhos marejados. BANG. E novamente os estilhaços caíram no chão e se partiram em pedaços ainda menores...

Sofia acordou antes de seu despertador, um tanto suada, e tremendo levemente. Ela era uma adolescente comum, seus curtos cabelos negros pendiam sobre sua face, escondendo parcialmente suas olheiras. Não se desesperou pela sua situação ao acordar, já era bastante habitual, sonhara com aquilo diversas vezes. A garota levou alguns segundos para levantar, tomada pelo desânimo, dirigiu-se até o banheiro para o tão monótono ritual de ida à escola.
O café da manhã estava sobre a mesa, junto com um bilhete pequeno, onde estava escrito:

            "Tive que sair mais cedo hoje,
coma TODO seu café da manhã e tome as vitaminas,
ou cortarei sua mesada!
-Mãe"

Sofia ainda não trabalhava, e precisava de dinheiro para comprar um espelho novo, então viu-se obrigada a comer tudo. Completamente cheia, a garota pegou sua mochila, saiu pela porta da frente e a trancou com a chave que carregava sempre na mochila. A escola que Sofia estudava não era muito longe de sua casa, então ela fazia o percurso inteiro a pé, passando sempre pela frente de uma loja velha e esquisita, que vendia artigos antigos. Suas vitrines eram cheias de bonecas com aspecto antigo e bizarro, caixinhas de música, quadros empoeirados, e mais uma variedade de quinquilharias. Sofia nunca entrou na tal loja, apesar da curiosidade constante, mas algo despertava seu interesse e sua vontade de entrar naquele local; um espelho bonito, de um tamanho médio, com a moldura de marfim entalhada, claramente visível através da vitrine.

Sofia não era nem de longe uma garota popular em sua escola, na verdade, a maioria das pessoas lá nem sabiam da sua existência. Ela faltava às aulas com muita frequência, e nas poucas vezes que comparecia, sentava no fundo da sala, sem se manifestar. Um dos seus únicos amigos (ou senão o único), era Louis, um rapaz tímido, porém brilhante, que também era "invisível" ao resto da classe. Louis claramente tinha uma queda por Sofia, apesar de não ser retribuído, ele sempre tentava conversar e alegrar a amiga, que normalmente respondia com frases curtas e resmungos decifráveis como "sim" e "não". Não que ela não gostasse dele, mas seu jeito era assim, quieta, introvertida, sem o hábito de falar muito.
Era a hora do intervalo, Sofia estava no pátio da escola, sentada sob a sombra de uma árvore, com as costas apoiadas no tronco. Ela sabia que o próximo período seria vago; a professora de literatura sofrera um acidente e machucou uma perna, ficando incapacitada de dar aula. Sabendo desse fato, Sofia aproveitou para ler sua atual série de livros favorita, que contava a história de um bruxo adolescente. Não havia passado nem 10 minutos, e seu sossego já seria interrompido, Louis vinha em sua direção, acompanhado por um outro rapaz, um tanto magrelo e esquisito, seus óculos com lentes grossas distorciam visivelmente a aparência dos olhos do garoto, deixando-o com um aspecto mais bizarro ainda.

Louis ajoelhou-se ao se aproximar o suficiente de Sofia, puxou uma folha de sua mochila, e estendeu para a garota.
-Vai fazer o que hoje de tarde? - Perguntou Louis visivelmente muito animado.
-Ainda não sei.. Por quê? - Sofia ficou um pouco nervosa, ela não sabia como se comportar diante de um possível convite.
-Eu e o Josh aqui, vamos nos reunir lá em casa com mais um pessoal, vamos jogar D&D até desmaiarmos! - Josh confirmou com a cabeça.
Sofia olhou para o papel na mão de Louis, e viu que era uma ficha de RPG em branco. Ela nunca tinha jogado RPG antes, e até tinha vontade de experimentar, mas a ideia de ter que ficar cercada de garotos estranhos, sendo a única menina, a deixava um tanto assustada.
-Ahm, eu vou ver o que farei de tarde, se eu puder, eu te mando uma mensagem... - Sofia mentiu, envergonhada, enquanto apanhava a folha.
-Tudo bem, então.. Nos vemos mais tarde. - Louis se despediu rapidamente, ele sabia que ela não iria comparecer, mas não a culpava.

A aula já terminara, e Sofia fazia o caminho de volta pra casa, como de costume. Porém, por algum motivo desconhecido, a garota entrou na tal loja que vendia artefatos esquisitos, e pela primeira vez, pôde visualizar toda a estranheza de perto. Os corredores não seguiam um padrão de estreitamento, uns eram largos e outros deveras apertados; as prateleiras eram antigas e empoeiradas, feitas de uma madeira envelhecida. Ela andou lentamente pela loja, observando cada objeto peculiar, e não notou nenhuma presença humana por lá.
Ao passar por um dos corredores, seus olhos se depararam com um grande item brilhante e chamativo, uma elegante espada fina, disposta sobre um pedestal de madeira negra. Sofia vislumbrou a brilhante espada por alguns segundos, e esqueceu-se por um momento em que lugar estava. Seu devaneio foi subitamente interrompido pelo dono da loja, cuja aparência era incrivelmente bizonha, que causou um espanto na menina. O homem era alto e magricela, porém passava a impressão de ser um tanto mais baixo, por andar curvado o tempo todo; ele não era velho, mas seus traços faciais envelhecidos o deixavam com um ar conflitante. Ele tinha grandes olhos esbugalhados que fitavam o rosto de Sofia incessantemente, enquanto mantinha um extenso sorriso amarelado; mal se mexia enquanto encarava a menina assustada.
Depois de um breve momento de silêncio constrangedor, o homem finalmente abriu a bocarra para falar com Sofia:
-Deseja alguma coisa, menininha? - ele esfregava as mãos lentamente.
-Err, nada não... - falou Sofia envergonhada e corando - Ah! Moço, uhm, senhor... qual o preço daquele espelho na vitrine?
O homem ficou levemente mais sério - Gostou do velho espelho da família Ciprian? - Sofia inclinou a cabeça, curiosa.


TO BE CONTINUED

SOFIELIZE

No meio de uma escuridão profunda, havia uma menina. Ali parada, olhando fixamente para frente, uma expressão catatônica, e os olhos marejad...